26 dezembro 2006

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Diário Digital
Pintora brasileira assegura próxima novela em Portugal
Jornal de Notícias - 22 dez. 2006
Uma pintora brasileira, de São Paulo, Cristina Ruiz venceu o concurso de guiões de telenovelas em Portugal, organizado pela Script Makers , empresa de Rui ...
Pintora brasileira será autora de próxima novela em Portugal Diário Digital
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Brasileira vence concurso para autor de novela em Portugal
Agência Lusa - 13 dez. 2006
São Paulo, 12 Dez (Lusa) - A artista plástica brasileira Cristina Ruiz, vencedora de concurso da emissora lusa TVI para autores de telenovelas, disse nesta ...

Nebulosa de Estrelas - parte I


Nebulosa de Estrelas - parte I


Chamava-se Lúcia.
Luz, verdade. Sua verdade, porém, era uma mentira.
Morava num bonito apartamento, bem mobiliado, imóvel de valor, lindos quadros, alguns pintados por suas mãos, num bairro que já fora antes nobre e belo como ela. Vida cotidiana, previsível, com certa estabilidade.
O carro era do ano, mas a cama já não rangia mais. Dedicada dona-de-casa, mãe e esposa; só não exercia há tempos o papel da amante, que lhe interessava tanto ainda, mesmo tendo passado há muito dos malditos e estigmatizados “quarenta”. Sabia-se jovem, queria ser seduzida.
Vinte anos antes, era bonita e intrigante. Hoje, vivia a plena desconstrução da esperada felicidade.
Tinha olhos de princesa, cor indefinida entre a turmalina e o topázio; olhar trepidante e iluminado. Olhar guloso.
Corpo “mignon” bem talhado, seios de fartura e firmeza sedutoras, cintura delicada. Sorriso doce e sensual. Casou-se de branco, virgem, plena de sonhos e esperanças, tentando apagar o amor devastador que lhe engolira, em fogo e lágrimas, a juventude.
- O Juca é bonzinho, gosta de mim. É de boa família. Vou ser feliz com ele – dizia sem entusiasmo
- Mas acho que isso não é tudo no casamento, oras!!
- Mas se eu num casar com ele, fico solteira e aí o Paulo vai se sentir o máximo, Rose – disse com raiva do ex – eu não vou dar o gostinho!! Caso com o Juca mesmo e quero que ele morra de dor nos cornos.
- Mas daí a casar sem gostar nem um tiquinho??? Fez bobagem. Isso num vai prestar, Lu. Você é muito fogosa e o Juca é todo paradinho...
Mesmo sem paixão pelo marido, dedicou-se a ser o melhor que podia, foi logo tendo os filhos – um menino e uma menina – tornou-se mãe extremosa, abafando por alguns anos a libido flamejante, em nome dos bons costumes apregoados pela mãe e a sogra religiosas, e bastante frustradas.
O marido, sexualmente não era mesmo dos mais competentes. Ex-estudante de colégio de padres, cheio de senso de pecado, perdera há muito tempo o interesse pela diversão, se é que tivera um dia. Não se animava diante dela nem com o uso de artifícios e artefatos. O dia dele começava antes do sol nascer e terminava num sono de sofá durante a novela das oito. Trabalhando sempre, dia e noite.
Não! À noite roncava o cansaço do dia, mantendo-a acordada, constatando a falta que lhe fazia a metade mais sensual do companheiro. Chorava no banho, impotente e envergonhada pelo que lhe conduzia a solidão e o desejo. Sonhava e fantasiava um retorno à vida. Uma chispa de fervor.
Os dias eram iguais. As noites eram para imaginar.
Queria conhecer a Grécia, mais que tudo. Adorava a mitologia, os deuses, suas lendas e seus amores.
- Um dia vou até a Grécia conhecer o templo de Dionísio – disse, tomando aos golinhos o vinho quente, na quermesse da igreja.
- Dionísio? – perguntou a sogra, que não era lá muito culta.
- O deus do vinho... do prazer... das orgias. – explicou para si mesma, sem atenção à ofendida senhora ao seu lado.
- Credo, que pecado!! Deus só tem o nosso, filha!! Esses outros são invenção do povo. Deus de bebedeira e sem-vergonhice!! Onde já se viu??? Deus tem que ser puro - persignou-se a mãe.
- Tem Afrodite, a deusa do amor... Eros, o do erotismo... Zeus e suas amantes...– mais vinho, suspiros e revolta cristalina – não essa vidinha sem graça da gente.
- Você reclama de barriga cheia, menina. Teu marido é um homem bom, paga as contas, é fiel, te dá de um tudo – diziam.
- Nem tudo....nem tudo, minhas senhoras... É fiel por falta de gosto mesmo.
A ela cabia suspirar e resignar.
Naquela noite sonhou um longo sonho. Sonho de teor alcoólico elevado; estava nos braços do deus grego, que a amava sobre folhas de videira. Muito vinho, odores, sabores e amores.

Os anos lhe tiraram os filhos, mas lhe trouxeram centímetros e quilos extras pelo corpo. Síndrome do ninho vazio tratada diariamente com muito chocolate e coca light.
Nada acontecia pra chacoalhar a vida, ano após ano.
Quis morrer. Mas não quis muito assim, não de verdade. Quis morrer só um pouquinho, pra ver se alguém se importava. Procurou ajuda.
- CVV, Paulo Rocha, boa tarde. Como posso ajudar?
- Paulo???
- Sim, senhora! Como é o seu nome? Posso ajudá-la?- Lúcia. Sim...é... não sei... eu estou me sentindo triste... acabou o zooloft – lembrava-se do seu Paulo. Mas claro que não podia ser, pensava, meio tonta.
- Sim, senhora, zooloft. Quem está em casa com a senhora?
- Ninguém... Eu pensei que seria melhor não precisar mais viver...
- Sempre vale a pena viver. Nada é tão ruim que mereça ser esquecido.
- Hum...mas... nem sei pra que estou por aqui
- Tente lembrar-se de algo muito bom, que a deixou muito feliz ultimamente?
- Ultimamente? Há quantos anos? Os filhos....
- Ahhh! Tem filhos? Qual a idade deles? Como se chamam?
- É...tenho... 23 e 21... Gabriel e Clarinha... mas têm a vidinha deles.
Preciso desligar! O feijão está queimando...
- Me liga depois, Lúcia. Paulo... Rocha.
“Paulo...Paulo...”
Passou a ligar todos os dias. Chamava por Paulo. O rapaz sempre solícito. Tinha uma voz linda.
- Oi, é a Lúcia... do zooloft...
- Que bom que ligou, Lúcia! Gosto muito de falar com você. – dizia o voluntário tentando mantê-la racional e longe de cometer tolices. Era carinhoso e solidário.
- Também, Paulo... Sinto sua falta...
- Sua voz está mais alegre hoje. Você deve ser uma mulher muito especial... Deve ser bonita – dizia, tentando subir-lhe a auto-estima.
Subiu-lhe a sensibilidade.
Apaixonou-se perdidamente por um Paulo que idealizou do profundo de sua carência.
As conversas seguiam diárias. Já não queria mais morrer.
Uma tarde arrumou-se bonita e foi até a o endereço do CVV, descoberto com muito custo. Perguntou por Paulo Rocha. Apontaram o rapaz.
Moreno. Não muito alto e meio gorducho. Cabelo curtinho, nariz batatudo. Pele estragada pela acne. Bem feinho.
Esperou que saísse para o cafezinho e aproximou-se.
- Paulo?
- Sim... – e sorriu seus dentes irregulares e nicotinados.
- Lúcia... do zooloft...
- Oi, Lúcia!!! Que surpresa... Nunca pensei.... Co-como me achou?? O que a senhora deseja???
“Senhora! Senhora! Senhora! - Desmoronou toda a sua idealização.
Desejo? O que eu desejo???” – Sentiu-se tola com certeza.
- Gostaria de ser voluntária... ajudar as pessoas. É isso! – respondeu sem pensar, mas precisando sentir-se menos constrangida. – fiz três anos de psicologia, mentiu.
- Ahhhhh....que bom!!! – respondeu o rapaz um tanto aliviado - Vamos lá dentro acertar tudo com Dª Cleonice.
Como era fim de ano, tinha muita gente desesperada e muitas ligações ao mesmo tempo. Sentaram-na num posto do tele-marketing e lá foi ela conversar com as pessoas.
Seu batismo de fogo foi uma mulher surtada, completamente drogada com muito anti-depressivo.
- Alô, alô!!! Meu Deus, eu preciso de ajuda. Não consigo atingir o orgasmo nunca!! Estou desesperada. Tenho certeza que o marido da minha melhor amiga roubou minha sensibilidade. Éramos namorados há anos atrás e ele me trocou por ela. Mas continuamos amigas...Ela não teve culpa. O cafajeste era ele. E eu fiquei sem meus orgasmos. Todas as sensações se foram com ele.... Eu...eu...eu sei... Só vai voltar se ele me devolver... O que que eu faço??? Ele me chama de louca...Se ele não me devolver eu me mato!!!!
- Não, minha amiga, pode ter seus prazeres, que o marido da sua amiga nunca mais vai saber o que é isso. Dê-lhe o troco à altura.
- É...
Conversou...contornou a situação. Ajudou...
- Meus parabéns, moça!
- Obrigada, Dª Cleonice – tenho muita experiência sexual – mentiu, satisfeita.
Gostaram de seu trabalho.
E lá ia ela, duas vezes por semana fazer seu trabalho sério, psicológico, cheio de responsabilidade. Ajudar pessoas a se sentirem mais felizes, aliviarem suas dores e necessidades de afeto. Ouvia problemas de todos os naipes.
- Meu marido me deixou e foi-se embora com o mecânico!! Vou matá-lo esta noite!!

- Tenho medo de tudo. Até de tomar banho. Não saio mais de casa... Tenho medo de gente...Tenho medo de dormir...medo do escuro...

- Perdi todo o meu salário no bingo. Não tenho nem para comer. Faz dias que só como pipoca...

- Dei todo o meu salário para a igreja. Precisava comprar um milagre. Estava pagando um carnê, mas não estava adiantando. Me disseram que se fosse à vista... Mas não aconteceu nada ainda...Acha que me enganaram??

- Sou sozinha, não tenho dinheiro, ninguém se importa comigo. Nada vale a pena. Minha aposentadoria é pouca e eu devo tudo no cartão de crédito da terceira idade.

Todas as nuances possíveis e inimagináveis da podridão e da miséria humana.
Achou que seria de grande valia ler livros de psicologia, auto-ajuda, tarô, kardecismo, neurolingüística, Paulo Coelho, fitoterapia e orientação sexual. Foi se instruindo. Sabia tudo sobre chás. Conhecia umas quinze dietas. Sua auto-estima foi subindo junto com os termômetros, por causa do verão que se avizinhava. Resolveu aprender dança do ventre. Fez um curso de “strip-tease”. Foi fazer yôga e começou a comprar lingeries e produtos de beleza.
Em casa, nem o marido nem os filhos perceberam essa pequena, mas profunda mudança. A evolução do querer para o poder.
Foi então que aconteceu o incidente que a fez renascer.
(continua abaixo...)

Nebulosa de Estrelas - parte II (final)

Nebulosa de Estrelas - parte II (final)
Numa tarde de trabalho voluntário, Valdete era a sua vizinha de posto. Quando ela se levantou para ir ao banheiro, deixou cair uma revista de fotos de posições sexuais.
- Valdeeeeeete!!! - arregalou os olhos - O que é isso???
- Shhhhiiiiiuuu!!! Calma – disse guardando rapidamente – Depois explico. Se souberem aqui, me expulsam.
Ficou agitada e curiosa.
Durante o cafezinho, Valdete, mostrou-lhe a revista. Além das centenas de fotos eróticas, tinha depoimentos reais de experiências sexuais, entrevistas com sexólogos, opinião de homens e mulheres. Um tratado sobre os prazeres do sexo. Valdete então, pôs-se a elogiar a sua maneira de atender as pessoas, sua delicadeza e atenção, deixando-a confortável e agradecida. Falou sobre o caso do orgasmo. Ela contou um pouco da vida, das frustrações, enquanto comia biscoitos light. Sem muitos rodeios, a amiga lhe propôs um posto como atendente num tele-sexo. Trabalhava nisso há cinco anos.
-É trabalho sério e honesto – explicou – lá também ajudamos pessoas com problemas. E o salário é ótimo.
Ela cismou. Ponderou. Analisou. E aceitou.
Se rebatizou Graciela e remoçou vinte e dois anos. Sua voz tornou-se mais sensual, um tantinho rouca. Um leve sotaque espanhol, treinado nos programas da TV a cabo. Encheu-se de suspiros e ais. Risinhos e gemidos.
A mudança física também se deu. Cortou os cabelos, fez luzes, foi malhar, emagreceu. Usava Channel n° 5 e passava batom vermelho com bastante gloss, para encarnar a personagem.
Baton, a poderosa arma que a transformava de mulher sem graça e simples em fêmea pronta para dominar o mundo e o que dele viesse.
Qual a estranha relação das mulheres com o batom?
Trabalhava cinco horas, todos os dias.
Falava com três, cinco, dez pessoas por tarde. Homens e mulheres. Jovens e idosos. Podia exacerbar a libido. Externava seus sonhos mais proibidos. Sussurrava fantasias. Transgrediu. Desabrochou.
Sexo outra vez!! Direito ao gozo e ao prazer. Podia ser mais feliz que todos os clientes. Estava se ajudando. Revivendo. Apaixonada.
No carro, final da tarde dizia em voz alta para si mesma e para Deus: ... por pensamentos, palavras, atos e omissões, por minha culpa, minha tão grande culpa... Perdoai-me, Senhor!! Ocultava providencialmente o “...não quero mais pecar.”
Recobrou o sentido da vida, numa paralela cheia de emoções. Numa nebulosa de estrelas.
- Hoje não dá, Rose. Tenho compromisso.
- Lu, você nunca pode vir! Que tanto compromisso cê tem? Você está estranha.... É algo que não quer me contar, Lu?
- Impressão sua, amiga! Eu sou a mesma. Te juro!!
O salário do tele-sexo ela guardava todinho na poupança. Não era dinheiro que importava. Isso ela tinha em suficiência. Esse dinheiro lhe trazia independência, é verdade. Dinheiro de marido é sofrido, humilhante. Mas o que lhe importava era a energia criativa do prazer e a alegria orgástica de estar viva.
Suas manhãs tornaram-se mais agitadas. Acordava cedo para caminhar. Dispensou o terapeuta. Foi fazer tai-chi-chuan. Leu o kama-sutra ilustrado. Aprendeu pompoarismo. Dança flamenca. Estudou história grega, egípcia, romana.
Descobriu a origem do baton, na sensualidade da lenda de Afrodite. A púrpura de Tyr. Sangue de ovelhas, misturado a óleos essenciais. Amoras. Vinho mosto. As mulheres da antigüidade já mantinham uma profunda relação com o poder que emanava do ato de colorir os lábios.
Às vezes ainda lhe batia a dúvida sobre estar ou não pecando. O que diriam a mãe e a sogra? Seria apedrejada como adúltera?
Nunca!!! A carne estava intacta. Não eram prazeres da carne. Eram delícias da mente. Eram fantasias. Embora as entranhas lhe tremessem, úmidas.
Foi se libertando do pecado. Foi se afastando do mal. Foi se importando cada vez menos com a indiferença dos seus. Celebrou o matrimônio consigo mesma e transmutou. Libertou-se das leis.
Tornou-se una. Adquiriu brilho e opinião. Passou a questionar os dogmas do cotidiano e deixar pra lá os chiliques dos outros. Caminhava nas nuvens.

Uma noite o marido a enxergou. Estreava uma camisola linda.
- Está diferente, você!
- É...
- Não sei bem o que... cortou o cabelo? – perguntou indeciso.
- Foi...
- Tá mais peituda?
- Não...
- Não sei o que houve, mas que tá diferente, tá!!
- Pode ser...
Virou-se e dormiu. Queria ir para o sonho. Não queria mais encarar a sua realidade insossa.
Tudo o que lhe dava vida e alegria estava do outro lado da linha.
Queria estar envolta nas brumas de sua vida oculta, onde era senhora de seus prazeres.
O marido quedou-se olhando a silhueta de seu corpo na penumbra, estranho e diferente agora. Sentiu-se excluído de alguma forma. O sono roubou-lhe o raciocínio. Depois pensaria nisso.
Não deu tempo.
- Juca! – sussurrou amanhecendo.
- Hum? – sonolento.
- Quero o divórcio! – e riu um risinho de nervoso.
- Que é isso, Lu? Tá delirando, menina? – falou sorrindo. – Brincadeira besta.
- Mas era melhor...
- Gente de bem não se divorcia. – cortou-a – assunto encerrado, mulher.
- Mas a gente mal se fala...
- Esquece. O que os outros vão dizer de mim? Nem pensar...
- Os outros? E eu??
- É! Os outros. Vão achar que não dou conta do recado. Que que tem você?
- E dá conta? – ironizou ela.
- Mulher direita não reclama dessas coisas. Não fica bem.
Sorriu marota, como se tudo não tivesse passado de uma brincadeira. Mas ele ficou olhando para ela de lado, quando ela entrou no banheiro. Não reconhecia a mulher. Algo nela estava diferente.
Olhou-se no espelho cúmplice de si mesma. Esboçou um sorriso que teve algo de maquiavélico.
Ela decidira naquele instante que todas as suas mentiras seriam, a partir de agora, verdades a realizar. Sabia exatamente onde ir buscar a sua luz.
Saiu resoluta, passou no banco, sacou todo o dinheiro da poupança. Um ano delicioso de trabalho. Tinha muito o que fazer naquele dia.
À noite o marido chegou meio ressabiado, tentando alcançá-la dentro de seu novo mundo.
- Estou pensando em comprar um pacote turístico pra Jericoacoara – disse inseguro – segunda lua-de-mel. Que você acha?
Ela o olhou num misto de pena e gratidão.
- Não vai dar, Juca. Vou dar um pulinho na Grécia semana que vem.
E ele soube que era tarde demais.